A greve dos professores e o problema de classe no Brasil - Para onde vai o Governador?




Nelson Soares dos Santos

A greve dos professores está próximo de completar 50 dias. Poucos acreditaram que duraria tanto, e agora ninguém sabe o que fazer. De um lado o Governo insiste em não negociar com grevistas, e pior, não apresenta nenhuma proposta real que possa de fato resolver o problema; de outro, o Sintego perdeu o controle da greve e está sendo guiado pelos professores que se organizam em um “movimento”. E, os professores, que não são políticos profissionais também não sabem o que fazer, mas não voltam ao trabalho sem a titularidade, ou seja, o grande problema é que o Secretário mexeu no que de forma mais cruel o ser humano defende: o prato de comida. Sim, o prato de comida, por que engana quem pensa que um professor com o salário que tem alimenta mais esperanças do que pagar as contas básicas no fim do mês.
Afinal, qual é o real problema da greve dos professores? Perguntaram-em recentemente qual era minha opinião sobre a greve e por que eu não me envolvia um pouco mais nela. Respondi com palavras costumeiras – temo pessoas que estão lutando em defesa da vida, do alimento, por que elas não podem ser controladas. O lado animal destas pessoas é despertado, e se tornam boiada estourada. É preciso mais que ser um bom vaqueiro para juntar gado assim. Neste sentido, temo que continuando neste caminho o estourou só aumenta. É isso, vida de gado como disse o Zé Ramalho. Vida de gado que tirado o capim o povo deixou de ser feliz. E aquele que considera o dono do gado está mais disposto a abater os touros valentes do que abrir as porteiras da área onde está o capinzal. Ai, surge um problema maior, onde está e quem são os touros valentes que guiam a manada e derrubam as porteiras?
Um observador mais atento do desenvolvimento da greve pode ver algumas coisas que vão se juntando. Quem leu o despacho do Tribunal de Justiça não pode deixar de refletir sobre a expressão “ Os professores devem voltar ao trabalho por que prestam serviço as camadas mais carentes da sociedade”. Eu percebi nesta frase duas informações verdadeiras: a) a primeira, realmente os professores trabalham para a camada mais carente da sociedade; b) A segunda é, que o estado está transferindo para os professores a responsabilidade pelo bem estar desta camada e retirando e deixando ao cargo de uma categoria de profissionais a responsabilidade. Já pensou se os médicos que trabalham no Hugo não tiverem o direito de reivindicar melhores salários por que trabalham para os pobres? Já pensou se os Policiais militares e civis não puderem reivindicar melhores salários por que fazem a segurança da classe mais carente da sociedade, afinal, a classe menos carente vive, em sua maioria, em condomínios fechados.
Outra observação interessante foi a forma como os deputados aprovaram a lei. Eles o fizeram sem ler e tiveram a coragem de dizer isso em alto e bom som, justificando que se tratava de um projeto vindo do Governador. Ora, de duas uma, ou o Governador não precisa de deputados e nem de Assembléia Legislativa ou os tais vivem apenas em busca dos próprios interesses, e que neste caso, trata-se de agradar a qualquer custo o governador. Na prática, é como se a Assembléia já estivesse fechada a muito tempo, e em vez de legisladores, o que se tem ali são Office Boys do Governador. Outra questão intrincada é a relação do governador com a oposição. Na prática a oposição é apenas um grande jogo de cena que não resiste a uma observação.
Tem ainda mais o que se observar. Na foto do Jornal Opção de um lado um Secretário, que como diz uma professora em greve - “ menino criado com Todinho e que nunca soube o que é trabalhar duro na vida para conseguir o próprio alimento”, branco, bem nascido, de fato, o Secretário nunca soube o que é ser do povo. De outro lado, a presidente do Sindicato, que pelo menos neste quesito representa bem a maioria da classe. Negra, oriunda das classes menos favorecidas da sociedade, filha de um batalhador, representa a esperança de milhares de professores que como ela, com dificuldades fez um curso superior, e tenta, servido a sociedade, garantir melhores condições de vida para si e para a família. Parece simples, mas é simbólico que em uma sociedade onde dizem já não haver mais lutas de classes, dois seres tão distintos se contrapõe em um luta cujo resultado está em jogo o bem estar de uma categoria e futuro de milhares que como diz o tribunal “ é a camada mais carente da sociedade”.
É verdade que a atitude dos deputados não estão relacionados a ideologias e ou classe, e é também verdade que quando o Sintego chegou a propor o fim da greve não representava a categoria. Tais fatos aconteceram justamente por que nem o Sintego, nem os deputados representa mais a chamada “ camada mais carente da o sociedade”. Esta está sem representante, sem defensores. Os políticos defendem apenas os próprios interesses, o sindicato transformou seus quadros em políticos profissionais, e como tal, também defendem os interesses dos dirigentes e não da categoria. O problema é quando vamos observar os tais interesses. Na verdade tais deputados e dirigentes não conseguem sobreviver com o conforto material do qual desfrutam se perderem as benesses vindas do viver agradando a quem está no Governo. Para aprofundar mais um pouco a questão é preciso perguntar. Thiago Peixoto conseguirá sobreviver politicamente se deixar a Secretaria de Educação? Os deputados conseguem se reeleger se começarem a ler os projetos do Governador e tentar argumentar em defesa dos interesses coletivos?
Entretanto, e por trás desta questão toda, existe sim uma questão de classe. No final, de um lado estão aqueles que tem o conforto, os filhos estudam nas escolas particulares, viajam para o exterior, vivem em condomínios fechados; de outro, está uma das categorias profissionais mas maltratada pelo Estado Brasileiro – os professores. Deixar de ver que o não investimento em educação no brasil é uma questão de classe, é ser míope. Não é preciso ser marxista para ver o fato. É preciso apenas que se tenha um pouco de sensibilidade. O que os professores estão tetando defender é o direito de comer carne e comprar algumas vezes no mês maça e banana para os filhos. Não é um salário que os deixará ricos, nem tão pouco, possibilitará mudar de classe social. A decisão que o Governador tomar na questão dos professores muito dirá do aspecto progressistas do seu governo. Não tem dinheiro? Abra todas as contas da Secretaria de Educação, apresente todos os gastos, cada centavo. Aumente o investimento em Educação. O que não se pode é deixar “ a camada mais carente da sociedade”, a mercê de si mesma, pois afinal, se olhar bem, os professores da rede pública são em sua maioria parte desta camada mais carente da sociedade goiana.

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