O PROFESSOR DE VOZ ROUCA E OS DESAFIOS DE THIAGO PEIXOTO[1]



Leio hoje nos jornais notícias novidadeiras sobre a situação da educação em Goiás. É como se tudo fosse ser feito de novo, reinventando a roda, e ensinando os rios a correrem para o mar. Explico: o projeto do Governo para melhorar a educação em Goiás começa a trombar com a realidade. Em contraposição as noticias dos jornais goianos li em um blog de Filosofia um artigo sobre a situação do professor no pais; “ O professorado mordendo o próprio rabo”[2], vi uma caricatura mais que verdadeira da situação vivida em Goiás. De  um lado o governo prometendo melhorar a educação, de outro, o sindicato fazendo o discurso de greve geral. Não gosto do pragmatismo no qual se inspira o autor do blog, mas se tem uma coisa que aprendi em filosofia é que a realidade é simplesmente a realidade, não importa qual óculos você usa, se você é capaz de ver, ali estará a mesma verdade. É assim a realidade da educação em Goiás, - caótica; seja para o fenomenólogo, para o pragmatista, marxista, ou frankfurtiano.
Na verdade o diagnóstico  pode ser resumido em poucos itens: eu diria que são de três o básico: a) professores mal qualificados e mal remunerados; b) alunos desnorteados da realidade; c) Estrutura material sucateada. Foi por estas razões que mesmo sendo um grande defensor do governo Marconi e de suas idéias achei ridícula a idéia de que trazendo Thiago Peixoto para a Secretaria de Educação seria possível fazer uma revolução na educação de Goiás.
Vamos ao primeiro: Professores mal qualificados e mal remunerados. Bem dito pela professora do Rio Grande do Norte, o que pode um professor fazer com 800 reais?  Mesmo o piso nacional dos professores é uma piada. 1.100 reais para se trabalhar quarenta horas, alguém já  imaginou criar um ou dois filhos com um salário desse? Só pode ser piada de mau gosto. O segredo de tudo é realmente o salário pois com uma verba desta não se pode esperar professores qualificados, já que não se pode nem sonhar em comprar livros, atualizar, ler jornais, ou coisa parecida.
Diante desta realidade erra o sindicado no discurso de ordem. Embora já afirmasse não gostar do pragmatismo tenho de admitir que a idéia do professor não seja ruim. Chegou à hora de admitir que nós, professores não estamos dando conta do recado. Eu tenho feito minha parte. Publicar textos neste blog sem nenhuma revisão, recusar a publicar trabalhos sem nenhum relevância científica é uma forma de admitir: senhores, desculpem não estou dando conta do recado que é exigido de mim. No entanto, isso não me faz pensar em suicídio. Sei que não sou a única vitima do processo, sei que o problema é histórico – os professores dos meus professores ensinaram de forma deficitária, e ,estes ensinaram aos meus professores de forma ainda mais deficitária; os meus professores me ensinaram como puderam[3], se bem que na maioria das vezes os próprios alunos faziam de tudo para que o professor não ministrasse aulas para não “aumentar” o  conteúdo da prova.  O sintego[4] deveria então admitir em nome de todos os professores a verdade: estamos mal qualificados, mal remunerados, e por isso não conta do que esperam de nós. Sim, temos dificuldade com a língua portuguesa, sabemos muito pouco de cultura geral, e pior, nossa capacidade de pensar está totalmente inexistente.  Devemos dizer já: Não, não conseguimos pensar com um salário de um mil e cem reais, na verdade,  o máximo que conseguimos é delirar de fome ou de raiva quando vai chegando no fim do mês e não sabemos o que fazer com as dividas que se acumulam.
Esta é a primeira razão pela qual é ridículo pensar que Thiago Peixoto faria a revolução. Não se resolve um problema deste tamanho em quatro anos. Minhas deficiências de formação? Já estou tentando resolver a quase dez anos, e ainda não cheguei ao ponto de partida. Mesmo que o secretário conseguisse pagar o piso, ( e isso ainda seria um salário ridículo) não conseguiria resolver o problema da má formação, pelo simples fato de que não tem professores qualificados em numero necessário em lugar algum, mesmo que o salário fosse atrativo. O segundo ponto  - alunos desnorteados. Não sei quem inventou a história de que o importante é que o aluno tenha boas notas no boletim. Deveria matar o imbecil que pronunciou esta frase pela primeira vez sem explicar que na verdade a nota no boletim só tem valor se explicitar o aprendizado de conteúdo e comportamental do aluno. Não se sabe quem inventou tamanha imbecilidade, só se sabe é que hoje os alunos estão atrás de ter boas notas no boletim, e  para isso vale tudo, inclusive chantagear o professor. Com isso, temos hoje uma escola de analfabetos. É extremamente natural alunos na universidade não saber ler ou escrever. Natural, ainda mais é encontrá-los no ensino médio e fundamental. A Educação básica se transformou em uma fábrica de analfabetos. O pior de tudo é que se criou um clima estranho para justificar as boas notas no boletim: o aluno finge que sabe, o professor finge que o aluno ta certo ( na verdade, em alguns casos o professor não finge, ele não sabe mesmo que o aluno não sabe, por que ele também já não sabe o que deveria ensinar); e cria-se uma realidade virtual, e um monstrinho é solto na sociedade se acreditando o ultimo sabichão da paróquia. A realidade se encarrega do resto: logo se transformam em adultos fracassados que não conseguem nenhum emprego e nem continuar os estudos.
O terceiro ponto não é segredo para ninguém. Já se tornou senso comum as imagens jornalísticas de escolas caindo aos pedaços, outras sem bibliotecas, sem salas de aulas, sem cadeiras para os alunos sentarem. Sim. Esta é a realidade da escola pública em Goiás. Não foi por não acreditar em Thiago Peixoto que reagi ao circo que se armou com sua ida para a base de apoio do governo e para a SEDUC[5]. Simplesmente, há  muito tempo sei que com educação publica não se deve brincar. E por mais competente que ele seja, de uma coisa eu tenho certeza, ele não é o gênio da lâmpada. Distribuir computadores para uma escola onde a maioria dos professores nunca teve acesso a um e não sabe utilizar não resolver o problema. Eleição de diretores? Isso não é novo. E um curso de algumas horas a mais não os transformará em novos gênios da gestão escolar.
O pior é que mais uma vez quem vai pagar o preço é o pobre do aluno pobre. Com o sintego disposto a declarar greve logo o fracasso do secretário será atribuído a questões políticas, disso ou daquilo e no final do ano mais uma vez o aluno terá tido um prejuízo incalculável. O professor está de voz rouca, não por que está doente, mas por que sua formação não lhe permite encontrar os argumentos corretos que faça ser ouvido pela sociedade, e o secretário? Bem, o desafio do Secretário é encontrar o Gênio da Lâmpada ou se tornar um, ou de outro lado, admitir que é apenas um ser humano e que viu no espelho e no canto da sereia do poder, muito mais do que a realidade permitia ver.


[1] Deputado federal eleito pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro e que migrou para base de apoio do Governo do PSDB – Partido da Social Democracia do Brasil, com o discurso de que sua mudança se justificava pelo sonho de se fazer uma revolução na Educação Goiana.
[3] E olha que passei raiva em muitos deles na graduação. Aqueles que não compreendiam o que ensinavam eu faziam questão de ler o livro todo só para deixá-los em saia justa. Lembro-me de um professor de sociologia que teve de admitir em sala nunca ter lido  “Ideologia Alemã” de Marx; e de um professora de Psicologia que nunca tinha lido “A interpretação dos sonhos”, de Freud. Como estes vivi ainda experiências engraçadas envolvendo Vigostky, Piajet, e na disciplina de História com fatos que me faziam torcer de rir.
[4] Sindicato dos Professores de Goiás.
[5] Secretaria estadual de Educação de Goiás.



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