O legal e o Moral no comportamento Político.

Nelson Soares dos Santos

Quando o senso comum se coloca a falar de moral é sempre uma confusão. Primeiro por que sempre se confunde a moral com a ética, e se põe a dizer que as pessoas não tem ética e coisa e tal; segundo, por que confunde o que é comportamento moral com comportamento jurídico ( legal). Em tempos nos quais virou moda na política falar em combate a corrupção, defesa da ética, da decência, da transparência e tantos outros valores ligados ao comportamento moral do ser humano é preciso esclarecer premissas que envolvem o comportamento político, ou do contrário estaremos sempre caindo ou em um realismo político, ou, de outro lado, em um moralismo abstrato.
A primeira coisa que é preciso esclarecer é que o comportamento político não será igual em absoluto, sobretudo em uma sociedade desigual, ao comportamento moral. Sendo assim, é preciso entender o que é comportamento moral e comportamento político, sabendo que ambos possuem semelhanças e diferenças entre si. Ademais, é preciso antes disso, entender como se compreende o que é comportamento político e o que é comportamento moral. Para isso, precisamos lembrar que comportamento moral são o resultado de todos os atos humanos praticados de forma livre, consciente e responsável, e que portanto, quando se fala de Ética, estamos falando de uma ciência que estuda o comportamento moral dos seres humanos; compreendendo assim que não existe ninguém sem Ética, embora possamos dizer que existem pessoas incapazes moralmente, que são o caso das crianças, dos doentes mentais ou daqueles que vivem na completa ignorância.
Bem diz Mário Sérgio Cortela que pode se definir Ética como o conjunto de experiências, conhecimentos, valores, etc, que utilizo para responder a três questões: O que quero, o que devo, e o que posso; isso por que segundo ele, existem coisas que posso mas não quero, quero mas não posso, posso mas não devo, devo mas não quero. A isto colocado nasce então as formas de comportamento humano. Adolfo Sanchez Vasquez, em sua obra, “Ética”, ao definir a Ética como ciência que estuda o comportamento moral do ser humano, afirma que isso acontece a partir de uma profunda integração que a Ética estabelece com outras ciências que estudam outras formas de comportamento humano, sendo elas, a Ciência Política, a Antropologia, o Direito, a Sociologia, a Economia, a Psicologia, a Psicanálise, a Biologia e outras ciências que estudam o comportamento humano, e, em sua origem com a filosofia, uma vez que a filosofia como origem da interrogação sobre o sentido da existência humana e do próprio conhecimento está na raiz do estudo do comportamento moral como ramo da filosofia, ou seja, como filosofia moral.
Sendo assim, podemos destacar, pelo menos, cinco formas de comportamento humano: o Comportamento Moral, o Jurídico, o Político, o Trato Social e o Religioso. É claro que não é difícil perceber, com uma pequena dose de racionalidade diferenças entre eles. O trato social poderíamos , de forma sintética dizer que são as formas de comportamento que assumimos nas relações com nossos pares, seja na família, na empresa, no clube de  lazer, nas ruas da cidade. É o tratamento que dispensamos aos outros e que a partir dele os outros constroem uma determinada imagem de nós. Não existem regras escritas determinando obrigatoriedade de um tipo de trato social e a forma de fazer nossas escolhas depende de como e por quem queremos ser aceitos na sociedade. No comportamento Religioso existem regras chamadas dogmas que na maioria das religiões são tidas como mensagens reveladas, e  os membros os seguem, muitas vezes mesmo sem compreender por que as estão seguindo.
No trato social e no Comportamento Religioso a existência se dá como sujeito individual na relação com os outros, no primeiro, e na relação com Deus no segundo. E nisso consiste a principal diferença de tais formas de comportamento para o Comportamento Jurídico, Político. No jurídico o individuo existe como membro de uma Instituição, uma país, uma nação cujas leis já existiam antes do individuo nascer, e estas mesmas leis são obrigatórias para todos. Na política, o individuo só pode existir como cidadão, ou seja, membro de um grupo, partido, cidade, estado ou país e está submetido a todas as formas de coerção impostas aos membros do grupo ao qual pertence. Aqui, vai a primeira questão que precisa ser lembrar ao pensar as relações entre a política e a lei. É na política, ou seja,  no grupo vencedor que se faz as leis, portanto, nas sociedades democráticas é na política que se modifica as leis e para tal é preciso que um grupo político torne-se hegemônico no uso dos instrumentos de governança.

O Legal e o Moral na Política na atualidade.

Consciente de tais diferenças resta agora refletir sobre legalidade e moralidade. É bem claro que nem tudo que é legal é elevado moralmente – digo elevado moralmente para não cair na idéia de que existe pessoas ou atos imorais, que quer dizer com isso? Relembrar as lições de Kolberg: O homem elevado moralmente no nível mais alto da teoria Kolberguiana não  necessita de leis, pois a única lei que possui é a própria consciência e harmonia com a sabedoria e a Justiça em um desejo puro de uma sociedade justa e perfeita. Assim podemos dizer que Nelson Mandela e Martim Luther King seguia a mais pura lei moral escrita na consciência quando transgrediram leis em defesa da justiça e da igualdade, levando-nos a  compreender que um homem elevado moralmente deve sentir na obrigação e sente de desobedecer leis injustas.
E aqui repousa importante questão: Como agir de acordo com a mais elevada lei moral funda na justiça, na transparência, na honestidade e em todas as virtudes que nos levam a sabedoria em uma sociedade corrupta e viciada? É necessário fazer esta pergunta para podermos entender a necessidade que se tem alguns homens que lutam por justiça de quebrar leis e  regulamentos na atualidade e que isso não os faz corruptos. A questão é: Na luta política devo cumprir um acordo com um corrupto sabendo que ele utilizará de meu ato virtuoso para prejudicar milhares de pessoas? É claro que muitos homens que buscam a justiça utilizam de tal argumento para se eximir da participação política, uma vez que, segundo eles na política é impossível viver com elevada retidão moral.
Tal posição, creio infundada. Caso os homens defensores da elevada retidão moral se afastem da política com tal argumento, os corruptos assumirão a hegemonia do poder, e, certamente por medo de uma rebelião dos homens de bem tentará exterminá-los da face da terra. O que é preciso entender, então, é que retidão moral em uma sociedade corrupta está relacionado ao tempo, e muitas vezes, ao tempo que excede a vida vivida. Parodiando o general romando vivido no cinema no filme “O Gladiador”, é preciso entender que “ O que fazemos na vida ecoa na eternidade”, ou seja, a definição de que, se fomos ou não justos na vida, não pode ser julgado no presente, apenas na posteridade. Parece-me que também esta é a definição presente em “A República” de Platão.
Outra questão que precisa ser colocada é que se é na política e por meio da hegemonia política que se faz as leis, somente teremos leis justas ou que se aproxime do conceito de justiça tendo homens virtuosos na política. E, tendo claro que não nascemos justos é preciso nos submeter ao processo educativo da vida prática para que possamos exercer as possibilidades de construção de uma sociedade cada vez mais humanista, igualitária e justa que permita aos homens evoluir no desenvolvimento de talentos e virtudes.
Na atualidade, quando tudo parece estar corrompido não podemos deixar-nos cair no erro  de ceder ao moralismo abstrato que tenta reduzir tudo a moral tornando a moral uma questão legalista; nem tão pouco, cair no realismo político, onde o vale tudo torna-se a norma e esquece o verdadeiro sentido da luta política que é a construção de possibilidades para a evolução do ser humano. A política da elevação moral, da honestidade e da decência é uma arte para homens que estão acima dos instintos da carne ( acima do fazer política com o fígado, o rancor e o ódio), e compreendem que a disputa política é necessária para evitar e coibir a violência direta ou a guerra entres os homens.

Conclusão – A Política e o processo de elevação Moral.

Considerado todas estas questões e sabedores de que não somos e não nascemos perfeitos ( Mário Sérgio Cortella diz que não nascemos prontos, Guimarães Rosa diz que somos seres inacabados e tantos outros); precisamos admitir que é na vida prática que vamos aprendendo a sermos justos. E é claro que aqui devemos concordar com os gregos de que os jovens não deve fazer política, e  devíamos acrescentar, não apenas os jovens de vida corporal, mas todos aqueles que não alcançar a condição de exercício do ato moral que requer condição do exercício da liberdade, da consciência e da responsabilidade. Poderia então fazer parte dos quadros eletivos apenas indivíduos cuja biografia demonstrasse possibilidades de errar menos quando estivesse diante de decisões que viesse exigir alta elevação moral.
É claro que os limites de idade hoje prevista em nossa constituição já tenta responder a esta necessidade. Entrentanto, é preciso mais. Seria preciso que os partidos políticos tivessem a responsabilidade de evitar, por exemplo, em um mundo globalizado e altamente especializado que alguém que ignorasse determinado assunto fosse colocado em posição de influenciar ou decidir sobre referido assunto. Esta sim, seria para os nossos dias a base para uma verdadeira e real meritocracia. O mérito que refletisse a liberdade, a consciência e a responsabilidade para que o sujeitos jamais pudesse se furtar de assumir perante as leis e a sociedade a responsabilidade por atos praticados e decisões tomadas.  Este é, para mim,  um dos elementos do caminho para resolvermos as desigualdades do nosso país, e quiçá, eliminar o alto grau de violência e crise de perspectiva entre as nações.

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