A vida que escapa pelos dedos e a morte compartilhada


Nelson Soares dos Santos[1]
É assustador a quantidade de pessoas que vivem com depressão nos dias atuais. Mais assustador é o grande número de pessoas que criam vidas ilusórias, vidas de facebook, vidas digital, extremamente distante da realidade que vive. Coloquei-me a pensar sobre quais são as razões pelas quais tanta gente tem sido vítima de doenças mentais leves, moderadas e graves. E, logo, me veio a mente a contribuição inequívoca que tem dado a evolução tecnológica, principalmente o chamado mundo digital. Com a criação de site de perfis como facebook, twitter e outros; muitas pessoas passaram a administrar diversos perfis e com isso abrem brechas para a criação de disfunção de personalidade.
O vício digital leva as pessoas a terem verdadeiras vidas paralelas. E não são os sites ditos públicos como facebook e twitter. Os piores males tem vindo mesmo dos sites de adultério, os chamados sites proibidos que incentivem a banalização da vida, a banalização da família, do casamento, do respeito próprio e até mesmo a dignidade humana. Além desses sites a recente onda do Watsap tem provocado verdadeiras tragédias, muitas vezes invisíveis na vida das pessoas. Quem não ouviu falar de uma mãe ou pai de família que não tem mais tempo para o filho por que está o tempo todo online? Quem não ouviu falar de pessoas que não conseguem sequer ir ao banheiro sem estar com o celular na mão lendo desesperadamente as mensagens de watsap? Quantas panelas já queimaram enquanto mães de família estavam envolvidas em grupos de sacanagem? E quantas mulheres e ou jovens já enviaram, por engano, e para grupos indevidos como para grupo do trabalho fotos nuas e vídeos íntimos?
Grande parte dessas pessoas já não vive. A vida já lhes escapa pelos dedos. Vivem submersas em um submundo, tolhidas pela tristeza existencial, e se tornando personagens de um mundo de mentiras. Criam uma realidade paralela e colocam em risco o bem estar de filhos e familiares quando muitas vezes abrem as portas de sua vida real a golpistas e exploradores que vivem de dilapidar o patrimônio alheio. Não seria problema ter um perfil em uma rede social qualquer desde que este perfil não viesse a criar uma personalidade mais importante que a vida vivida, a vida real.
E quando se adoece na vida real o que os amigos virtuais fazem? Quando o amigo virtual posta a doença ( sentindo-se mal), os demais amigos vão lá e curtem. Transformou-se em moda curtir a doença alheia e compartilhar a dor da morte, quando de verdade, pouco se faz para aliviar a dor real. A responsabilidade pelo doente ou pelo morto fica sempre para os familiares, que muitas vezes, desconhecem certos perfis e amigos virtuais que o individuo faz parte. E muitas vezes, acontece de amantes virtuais querer desrespeitar o luto do viúvo querendo aparecer no enterro da amante ( mulher casada), provocando constrangimentos aos familiares e amigos, de forma irresponsável e endoidecida.
Há que se aceitar que a vida está escapando pelos dedos de muita gente devido à dificuldade de lidar com o mundo virtual. As clínicas psiquiátricas e de psicologia estão cada vez mais lotadas. O contato com a realidade fica mais difícil. Ao refletir sobre esta questão, parece que um dos caminhos para evitar a perda do contato com a realidade é não construir uma personalidade falsa, outro eu, um outro ser distante daquilo que de fato se é. Negar a realidade em que se vive postando fotos mentirosas, colocando dados que não são reais são passos decisivos no caminho da morte do eu verdadeiro.




[1] Nelson Soares dos Santos é Licenciado em Pedagogia, Mestre em Educação Brasileira e Professor Universitário de Filosofia e Ética.

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