Operação Monte Carlo: Sinais dos tempos?



Nelson Soares dos Santos


Tenho acompanhando cotidianamente os desdobramentos da Operação Monte Carlo que prendeu o acusado de explorar jogos de azar em Goiás, e de contravenção, Senhor Carlos Ramos Cachoeira. Dos acontecimentos até agora revelados muitos são dignos de reflexão, no entanto, quero tratar de três apenas, como ponto de partida, para que possamos pensar em que sociedade estamos vivendo e que sociedade queremos. A primeira coisa que me deixa espantado, perplexo é a reação de jornalistas, empresários e políticos de todas as matizes; a segunda, é como de fato há um espanto, como se houvesse um real descoberta sobre Demóstenes Torres;e a terceira, é a forma como se lida, os acusadores de um lado, e os defensores de outro.
Já escrevi diversas vezes, neste espaço sobre a imprensa em Goiás. Seja na forma escrita, rádio ou televisão, o que se vê é que não existe jornalismo independente. As coberturas realizadas nas operações existentes mostra isso, vide, Operação Sexto Mandamento, a cobertura sobre o Governo Alcides, dentre outras. O que se vê, e de forma generalizada é uma imprensa que age ao sabor das verbas publicitárias. É claro que para que tal argumento tivesse mais credibilidade era preciso apresentar dados que demandaria trabalho para além do tempo que tenho disponível, no entanto, se acompanharmos apenas as posições dos jornalistas na operação Monte Carlo, pelas postagens na internet, e reportagens nos jornais, não fica difícil perceber a existência de duas torcidas organizadas: uma que defende o PT/PMDB e seus aliados, e, outra, em defesa do Governador Marconi e seus aliados. O problema é que o que se faz cai em um tipo de linguagem quase chula, falácias, tautologias, que envergonharia qualquer professor de curso de Jornalismo. Um exemplo é a disputa que se apresenta, como se o objetivo fosse demonstrar que ambos os lados estão envolvidos no crime, e ao ignorar a possibilidade da existência de um terceiro grupo político no estado, diferente da bipolarização falsamente construída, passa-se uma ideia de que não existe ninguém no estado que não esteja envolvido, direta ou indiretamente com o Crime.
Outra questão é o espanto que se vê nas ruas de gente e mais gente, dizendo, quase envergonhados pois realmente acreditavam no Demóstenes. A maioria dos eleitores de Demóstenes, pelo que pude acompanhar nos últimos dez anos, são pessoas racistas, conservadoras e, as vezes, reacionárias, ou alienados por uma ideologia que não condiz com a realidade em que vivem. Um exemplo, grande parte dos “eleitores envergonhados”, são aqueles mesmos que pagam propina ao guarda, faz gato na energia, subornam faculdades para conseguir diplomas falsos, e tantos outros delitos. Difícil entender que estas pessoas ao condenar Demóstenes, agora, na verdade estão condenando elas mesmas, que também tem um discurso ideológico, o qual não seguem, que radicalizam na separação da vida pública da vida privada, ou seja, aquele que esbraveja nas redes sociais contra a corrupção e na noite de sexta feira vai para o prostíbulo desfrutar prazeres com meninas de 16 anos de idade. No entanto, acreditam que não podem ser condenadas e que ninguém tem o direito de discutir o que fazem na vida privada.
E, por último, a forma como agem acusadores e defensores. Nas redes sociais a impressão que se tem, para um observador, é que reina um desespero geral na sociedade goiana mais esclarecida. Aliado aos discursos de que “Toda pessoa com alguma relevância social, ou os principais quadros políticos de Goiás já tiveram algum contato ou fizeram negócios com o Cachoeira”, instalou-se uma verdadeira verborragia para demonstrar que não existe nenhum quadro político isento de culpa. O desespero é tanto que parece que a mentira é verdade, e que culpado mesmo foi a Polícia Federal e o MP, por terem feito a investigação. O alcance dos tentáculos, que segundo a mídia já chega a quatros estados mais o Distrito Federal, coloca os crimes investigados como se fosse algo moralmente permitido, e de que a saída é legalizar o jogo do bicho com toda as particularidades com que foi tramada pelo Empresário Cachoeira. O que mais se vê são tautologias e falácias de todos os tipos, na tentativa de explicar o vão existente entre o moralismo abstrato e o realismo político banhado de pragmatismo que se instalou no Estado.
Há uma passagem bíblica que fala sobre os finais dos tempos. Nela, diz mais ou menos, de que a justiça se esvairia da face da terra, que o mal pareceria prevalecer. Quando se observa, não só o tamanho dos tentáculos do Empresário bicheiro, e a forma como a sociedade reage, fica a sensação de que estamos vivendo os sinais dos fim dos dias. O poder que deveria cuidar da justiça, usado para espoliar, roubar o mais fraco. Os homens públicos que deveriam agir com prudência e sabedoria, travestidos de mensageiros da anomia social, da contravenção, e da quebra da lei, e, os homens, fingindo que não vêem os próprios atos, imersos em um farisaísmo e hipocrisia infinita. É como se a frase de Rui Barbosa tornasse realidade, e, os homens honestos começassem a sentir vergonha de serem honestos de tanto ver o mal prevalecer. Fala-se de ética e de moral para justificar o autoritarismo, a perseguição, o amordaçamento, o atentado a liberdade de expressão. Fala-se de ética para justificar a desordem, a injustiça, e a exploração do mais fraco. O humanismo se esvai engolido pelo mundo das aparências ficando cada vez mais difícil perceber as reais motivações dos tomadores de decisões. Ser corrupto tornou-se normal, e quase perfil necessário para ser um homem público. É tudo isso que me fez aprender que não é preciso buscar a virtude, é preciso aprender a conviver com o vício sem deixar de ser virtuoso, até que o joio possa ser separado do trigo.

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