Joaquim Barbosa e o Racismo Brasileiro
Nelson
Soares dos Santos[1]
Estou
cada dia mais preocupado com as manifestações do Racismo no Brasil. Estes dias,
li nas redes sociais a expressão “Urubu quando não caga na entrada, caga na
saída”. Pasmem meus leitores, a
expressão foi utilizada se referindo a Joaquim Barbosa, o presidente da mais
alta corte judiciária do país, e, se alguém pensa que foi utilizada por pessoas
pouco esclarecidas, pasme mais ainda, na verdade era um debate entre advogados
com carteira da Ordem dos Advogados do Brasil que debatiam sobre os erros e
acertos do Ministro Joaquim Barbosa.
Há
quem diga e, eu concordo, que a presença de Joaquim Barbosa, um negro, na mais
alta corte do país vem contribuindo para emancipar o negro brasileiro, fazer o
mesmo assumir sua brasilidade e sua cor, sentindo assim que o Brasil é o seu
país e de que ele, negro pode ser um cidadão. Esta é a verdade na qual eu quero
acreditar. A presença, porém, deste tipo de debate nos alerta para outros
problemas e para a necessidade de se criar novas formas de combate ao racismo
tanto no plano cultural e intelectual quanto no plano jurídico. No próprio debate, que o leitor pode ver no
print abaixo, há quem saia em defesa do Ministro Joaquim de forma racional. E é
verdade, que se Joaquim Barbosa possa ter cometido alguns erros não se pode
afirmar que isso se deu por causa da cor de sua pele, pois o mesmo raciocínio
levaria a entender que os condenados do mensalão ou outros tantos ladrões país
a fora o são, também por causa da cor da pele.
O
que preocupa mesmo no argumento utilizado é quem o utiliza. Quando operadores
da lei e da justiça deixam a racionalidade para agir como torcedores de time de
futebol, colocando de lado todos os métodos da hermenêutica jurídica para
explicar erros utilizando como argumento a cor da pele do cidadão, pode se
afirma sem medo de erra que há alguma coisa errada neste país, ou melhor, com a
educação deste país. Certa vez Paulo Freire disse que o problema de alfabetizar
pessoas é que uma vez tendo aprendido a escrever elas saem por ai escrevendo de
tudo sem o mínimo de responsabilidade; aqui, e no caso, a internet age como era
a alfabetização nos tempos de Paulo Freire. O individuo pouco sabe argumentar
e, uma vez, sabendo organizar alguns parágrafos, pensa que é argumento e
destila veneno e ressentimento nas redes sociais. É o Caminho aberto para a
manifestação de um racismo enrustido, ressentido, maldoso e cruel. Esquece o individuo
que acesso a internet não o torna capaz de análises profundas.
Argumentos
como este têm proliferado nas redes sociais mostrando que temos um tipo de
racismo cruel neste país, um racismo capaz de desrespeitar não somente as
pessoas mas a própria nação, por que quer queira ou não, afirmar que Joaquim
Barbosa erra por causa da cor da pele é uma forma de desrespeito a todos os
brasileiros. E neste sentido, errou mais ainda o Ex- Presidente Lula ao afirmar
que foi um erro dele indicar o Ministro JB. Ora, tal afirmação é também um
profundo desrespeito a constituição, ao Congresso Nacional e a todos os
brasileiros por que passa a mensagem de que na verdade Lula governou como um
Ditador solitário em sua torre de Marfim.
Joaquim
Barbosa : a defesa da democracia.
Qualquer
pessoa com um mínimo de racionalidade é capaz de perceber que não foi Joaquim
Barbosa que condenou os réus do mensalão, e sim, uma coorte. Aliás, uma corte
onde a maioria absoluta é de brancos claramente descendentes de europeus.
Atribuir a JB, a desgraça dos condenados é risível e uma forma de racismo em si
mesmo. Qualquer que fosse o presidente teria que cumprir o rito regimental e o
cumpriria cometendo erros e acertos provocados pela pressão das circunstancias.
Joaquim
Barbosa tem tentando cumprir com zelo a sua função consciente da
responsabilidade que tem para com o país, mais do que mesmo consciente da responsabilidade
que tem para com os negros seus pares. Aliás, ele se recusa a processar
racistas declarados que desrespeita a forma pela qual se deve tratar um
ministro da mais alta Corte. Eu mesmo testemunhei sua recusa em processar o
goiano Kid Neto quando se tinha as provas cabais do crime de racismo nas redes
sociais. Tal comportamento não ajuda a emancipar os negros, pois se pessoas se
acham no direito de desrespeitar um negro presidente da mais alta corte de um
país, o que não fará estas mesmas pessoas com um garçom de restaurante?
Joaquim
Barbosa tenta o tempo todo se fiel a Constituição de 1988, que todos sabemos
ser um mar de contradições. Uma constituição que procurou agradar gregos e
troianos e que na atualidade já tem tanta emenda que só os especialistas em
direito constitucional sabem definir o que é a constituição e o que são as
emendas. Mesmo assim, JB tenta salvaguardar a democracia, a impessoalidade do
ato jurídico e da coisa julgada. Os advogados deveriam perceber isso, mas se
contentam em exercer o juris esperneandis
como se diz no mundo jurídico, ou seja, o direito de espernear. O estranho
é que a decisão da condenação já transitou em julgado e é mais estranho ainda
ver operadores do direito e da justiça contestando decisões da mais alta corte
do país.
Joaquim
Barbosa zela pela democracia quando procurar agir com imparcialidade. E não
quero entrar no mérito aqui dos problemas pelos quais o acusa nas redes sociais
de favorecimento do filho, relações com líderes do PSDB, etc . Esta confusão
entre público e privado não ajuda a
enriquecer nossa democracia. A questão que se deve discutir é como procurar
meios de se apurar todos e quaisquer delitos que possa impedir a democracia
brasileira de se chegar a maturidade. O mensalão do PSDB, deve ser julgado pelo
bem da democracia; o Trensalão paulista tem de ser julgado. Enfim, é hora mais
do que nunca, de se passar este país. Ou enfrentamos a corrupção e a vencemos ou
a corrupção destruirá o futuro deste país.
Não
será atacando JB, tentando explicar os atos do mesmo tendo o argumento da cor
da pele que vai acabar com a corrupção deste país. O que tem que ficar claro é
que chegou o momento de negro ou branco respeitar a constituição, as leis, ou
do contrário ser condenado e cumprir pena na cadeia. Chegou a hora de a lei ser
para todos e não mais apenas para negros, pobres e prostitutas. Os “doutores”
bacharéis deste país que saem de muitas faculdades de direito com dificuldade
de escrever um bom texto, ou mesmo com dificuldade para ler e interpretar, deve
saber que está chegando ao fim o tempo dos privilégios deste país. A Justiça
é para todos, será para todos. E que bom
que é um homem ( de cor negra, o que necessariamente não deveria ser
relevante), que está cumprindo o seu papel simbólico de dizer: chega de
privilégios. Que a lei seja cumprida neste país e seja para todos.
[1]
Nelson Soares dos Santos é membro do Diretório Estadual do PPS em Goiás, e
Professor Universitário.
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