Por uma política humanista de combate ao Racismo.


Nelson Soares dos Santos[1]

Não consigo conceber a ideia de um partido humanista, democrata e socialista sem que haja no seu interior e por meio de sua força na sociedade uma luta constante por igualdade de oportunidades. No congresso passado, trouxe a ideia de que era preciso que lutássemos por educação de qualidade e não posso dizer que tenha sido em vão. O Partido esteve presente, na esfera federal, em todas as discussões sobre os avanços na política educacional, embora, internamente e nas direções estaduais a questão parece não ter avançado bem, pois não surgiu como assuntos nos debates dos congressos estaduais os quais acompanhei.
Embora não tenha esquecido a cara questão da Educação, que ao meu ver, o partido deve assumir a responsabilidade de apresentar ao país uma proposta de política educacional inovadora, o que me traz a este momento é uma outra questão, tão cara quanto ao direito de educação para todos: a questão da igualdade racial. Hoje, praticamente todos os partidos sérios possui lideranças engajadas e com propostas no campo da Igualdade Racial, sendo os mais avançados, tanto na teoria quanto na prática, os movimentos ligados ao PT e ao PC do B. O primeiro, por meio do Movimento Negro Unificado ( MNU), e o segundo, por meio do Movimento “ União dos negros pela Igualdade” ( UNEGRO). Tais partidos e movimentos vem dando constantes contribuições a causa da igualdade racial no Brasil tanto no  campo da teoria quanto da prática. Entretanto, nos últimos anos a ação destes mesmos partidos tem feito a luta racial seguir por caminhos tortuosos e limitado o alcance da mesma.
Aficionados por uma ideia de militância politica e defesa do poder, e de se estar no poder os movimentos vem se apequenando e perdendo a característica emancipadora e libertária. A luta do negro não pode ser para vencer o branco, não pode ser uma luta pela ocupação de espaços de dominação do outro, antes, é uma luta que deve trazer em si a libertação de todas as raças, por que fundada em uma ecologia da sustentabilidade onde a tolerância às diferenças seja a chave para o convívio pacífico com todos e entre todas as raças. A ideia da igualdade não pode suplantar o mérito sob o risco de apenas inverter a realidade e continuarmos em uma sociedade tão injusta quanto antes.
São por estas razões que o PPS, um partido humanista, defensor da radicalidade democrática, socialista e libertário não pode se furtar a apresentar a sociedade brasileira uma proposta de política humanista de combate ao preconceito racial e a todas as formas de discriminação. Uma política que traga em seus fundamentos a libertação do ser humano da servidão a que todos estão submetidos na atualidade, desde o consumismo perverso a outras formas cruéis e reacionárias de dominação.
A questão do negro no Brasil.
Os avanços da luta por igualdade racial no Brasil são visíveis até mesmo para aquele mais cruel racista que se nega a ver. Há avanços simbólicos como a criação do dia nacional da Consciência Negra ( 20 de novembro); como uma forma de reconhecimento a grande contribuição de Zumbi dos Palmares na construção de nossa brasilidade; até as conquistas mais efetivas como as leis de cotas que geram a emancipação financeira, social e intelectual de muitos negros.
Podemos citar em poucas palavras a situação atual nos tópicos abaixo.
a)                                  Esgotaram-se as dúvidas e os questionamentos sobre a legalidade e legitimidade das ações afirmativas com o pronunciamento do STF na ADPF movida pelo DEM contra as cotas raciais nas universidades públicas. Para o STF as cotas são constitucionais e legítimas, podemos através delas incluir negros e pobres nas melhores universidades públicas brasileiras, bem como podemos lançar mãos de várias iniciativas com vista a mitigar as desigualdades decorrentes dos agravos do racismo.
b)                                  Foi instituída uma mais densa rede institucional de igualdade racial - essa rede compreende a soma dos conselhos, assessorias, coordenadorias, secretarias de igualdade racial nos âmbitos municipais, estaduais e federal - consolidando a dimensão antirracismo no pacto federativo.
c)                                   Foi aperfeiçoado o ordenamento jurídico brasileiro em matéria antidiscriminatória. A aprovação da Lei 10.639/03 que institui a obrigatoriedade do ensino da África e da Cultura Afrobrasileira nas escolas, do Estatuto da Igualdade Racial e da Lei que institui cotas nas universidades públicas federais somadas aos preceitos constitucionais, leis e decretos presidenciais existentes ou recém-promulgados coloca o Brasil na dianteira em relação a legislação de proteção e promoção social de população racialmente discriminada e marginalizada socioeconomicamente. 
d)                                  Por fim, dos novos membros da classe média brasileira que se constitui nos últimos dez anos, 78% são negros, o que mostra que a política de cotas é um caminho certo para minorar as desigualdades no país.
Apesar de tais avanços o racismo resiste, seus nefastos efeitos como a desigualdade salarial entre negros e brancos (36% segundo DIEESE); sub-representação de negros em espaços de decisão e poder (a população equivalem 50,6% dos brasileiros e 8,3% dos congressistas, segundo pesquisa da UNEGRO de 2011, e, se for feito um levantamento esta mesma porcentagem ou semelhante será encontrada nos partidos políticos e demais instituições, inclusive no nosso partido) e o espantoso índice de homicídio que tem vitimizado a juventude negra (o índice de mortes violentas de jovens negros foi de 72, para cada 100 mil habitantes; enquanto entre os jovens brancos foi de 28,3 por 100 mil habitantes, segundo Mapa da Violência) sintetizam a força do racismo no Brasil.
Acresce-se a isso que a emancipação, quando e onde houve se restringiu ao aspecto financeiro e por vezes, intelectual ( hoje já existe inclusive o Conpene – Congresso Nacional de Pesquisadores negros; grupos de pesquisas nas principais Associações Científicas do país, e programas de mestrado e doutorados  direcionados a negros, bem como tentativa de inserção dos mesmos em carreiras antes totalmente fechadas, como a diplomacia), não alcançando a emancipação política e espiritual. O negro continua sendo extremamente sub-representado no meio político, nos partidos políticos e outras instituições de caráter político; e, sua religião continua não re conhecida pelo Estado.
Uma política Humanista de Combate ao Racismo.
Uma política Humanista, democrática e socialista de combate ao racismos deve ir além da proposição da emancipação financeira e intelectual. Deve primar pela libertação política, pelo aprendizado do uso da liberdade e da libertação de si mesmo para ir de encontro com o ser humano. Parece que afinal era esta a ideia do PPS em um passado recente, quando de forma avançada propôs o fim do conceito de estrangeiro. Uma política de combate ao racismo não deve envolver apenas a emancipação dos negros, mas de todas as raças e a inclusão das mesmas no espectro social promovendo uma ecologia sustentável e coexistência pacífica entre todos.
É claro que jamais deve se perder de vista a luta pela emancipação financeira. Esta deve ser a base e o fundamento de toda as demais lutas. Entretanto, aqueles que já alcançaram esta meta devem seguir adiante em busca de uma consciência humana. Daí por que a proposta não é de criação de um movimento negro no partido, e sim, de uma Coordenação Nacional de Combate a todas as formas de racismo, preconceito e discriminação.
Esta coordenação terá como responsabilidade percorrer o país, discutir as formas de preconceito, racismo e discriminação para apresentar contribuições para a elaboração de uma politica nacional ou que apresente avanços aos arremedos de política nacionais hoje implementados. E desta forma poderemos dizer que não nos omitimos em uma luta que certamente se acirrará nos próximos anos e que poderá trazer consequências a toda população brasileira e aos destinos de nossa nação.



[1] Nelson Soares dos Santos é membro do diretório Estadual do PPS em Goiás, e professor Universitário.

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