A reforma política e suas possibilidades.
Ao tentar pensar sobre a reforma política que se discute no congresso nacional e nos meios políticos, nas redes sociais e outros espaços da sociedade brasileira, não consigo elaborar uma idéia sobre o tema sem antes refletir sobre a questão do comportamento humano na sociedade. Só é possível entender a necessidade da reforma política se compreendermos as diferenças de comportamento necessárias que devemos ter em diversos espaços da sociedade na busca de saciar as nossas necessidades especificamente humanas.
Começo por ressaltar a idéia de que a diversificação do comportamento humano é um dos elementos pelos quais se pode aperceber a evolução moral de uma sociedade, ou o seu retrocesso. Na medida em que o individuo toma consciência do seu comportamento, liberdade de escolha, e consciência de suas responsabilidades, mais o comportamento humano se diversifica apresentando em formas novas e não esperadas ou ressurgindo formas antigas que necessitam e buscam novos espaços de aceitação. Diversas formas de comportamento podem ser tidas como milenares, sendo elas: o trato social, o político, o jurídico ou regulamentado pelo estado, o religioso – restrito às igrejas, e o comportamento que a todos os demais engloba é uma esfera mais ampla que as demais englobamos o comportamento moral.
A reforma política trata especificamente do comportamento político, ou do comportamento dos indivíduos como agentes políticos que se unem em grupos, classe ou movimentos com o objetivo de conquistar ou tomar o poder. Na política o individuo não existe como ser singular, e sim como agente político, membro de um grupo, de um partido político, de um movimento social um de uma classe. No Brasil, a regulamentação do mundo político sempre foi problemática havendo momentos de extrema regulamentação e outros, de afrouxamento.
Durante o período imperial não foram poucos os momentos de instabilidade política resultado de falta de regras de como se conquistar e manter o poder, e a participação política. A abdicação de D. Pedro I, o fim do Governo de D. Pedro II, e no início da república. A revolução de 30 foi um momento de reação a forma elitizada da participação na política, e como resultado houve inúmeros avanças, seja na garantia dos direitos dos trabalhadores, das mulheres, institucionalização dos movimentos sociais e maior influência do povo nas decisões governamentais. Em 1964, novas mudanças provocaram retrocesso para a democracia, como o retorno ao bipartidarismo ( arena x MDB), o fim do voto direto para eleição de presidente da república, e um controle exagerado da liberdade de expressão, considerado por muitos de supressão total das liberdades individuais.
As lutas pelas eleições diretas, por liberdade de expressão foram evoluindo para a luta por anistia, devido os instrumentos que se utilizavam, tanto o governo quanto segmentos da população na luta pela disputa do poder. Tanto o governo quanto a sociedade quebraram as regras do contrato social e a anistia geral e irrestrita era a única forma de recomeçar a luta por regras e normativas de como se relacionar dos diversos grupos que disputavam o poder. No final, tratou-se do superficial para em seguida tratar do essencial. A reforma política que se seguiu a anistia fez retornar o pluripartidarismo, as eleições diretas para presidente, e abriu caminhos para o debate e a busca do consenso majoritário para questões a partir do diálogo entre os diversos grupos e segmentos da sociedade.
O governo Collor, primeiro presidente eleito pelo voto direto, teve como seu principal erro não conseguir estabelecer um diálogo com os diversos seguimentos sociais e grupos em disputa, e, por isso, conseguiu unir os mais díspares e diversos grupos contra seu governo culminando no seu impedimento. Itamar Franco que o sucedeu, com sabedoria mineira, deu grande contribuição ao criar as condições em seu governo para a realização do plebiscito que definiu a forma presidencialista do governo. No ano de 1994, três outras emendas modificaram o caminho do exercício do mandato político, sendo a primeira ( emenda 04) tratou dos casos de inelegibilidades, a segunda ( emenda 05) redução do mandato presidencial de cinco para quatro anos; e a emenda 06 que determinou a suspensão dos efeitos da renúncia do mandato parlamentar para efeito de perda de mandato. No governo FHC, a mudança do processo de mandato do presidente para a possibilidade da reeleição pele emenda 16, foi mais uma importante mudança na forma do jogo político eleitoral.
Várias mudanças ainda tiveram até o momento, umas mais polêmicas, outras menos. A chamada lei dos partidos políticos, a Lei das Eleições; a primeira deu autonomia aos partidos políticos para escolher suas coligações e processos internos; a segunda, resultado de forte mobilização popular tratou de diversos itens que dizem respeito ao processo eleitoral. Dito isso, fica claro que a reforma política vem acontecendo com mais ou menos celeridade durante o aprofundamento da democracia e da participação popular no processo político.
A proposta atual.
A novidade do momento é que a reforma política tende a ser mais profunda e aplicada de uma só vez, e, que mais ainda, a proposta de reforma vem como proposta do governo executivo que se propõe a encampar diversas reformas necessárias para o crescimento e desenvolvimento do país. A nova proposta chegou ao congresso em um momento em que lá existe 98 Projetos de Lei que tratam de algum aspecto da reforma política, sendo que uma vez encampando todos estes PLs, eles foram suspensos e a comissão especial passou a analisar todas as perspectivas pelas quais existe um clamor de normatização.
Imagine que a reforma política não é algo de fácil consenso. Os 98 Pls, que estão sendo trabalhados na comissão especial representa a pluralidade das idéias do nosso congresso com 513 deputados e 81 senadores. Um estudo do Senado federal dividiu estes Pls, em 10 grupos, uma vez que foi identificado que os 98 tratam de propostas diferentes para basicamente 10 possibilidades. Sendo assim, significa decidir como se vota para vereador e deputado, como se organiza os partidos políticos internamente, como se escolhe os candidatos, etc. A questão porém é que tais propostas para serem unificadas precisa que seja feita um profundo diálogo entre as correntes de poder, e correntes ideológicas que são representadas no congresso Nacional. Com já afirmei em artigo interior neste espaço, a base do governo não tem unanimidade nestas questões por que o seu aspecto pragmático não lhe permite unidade ideológica e sendo assim, questões que dizem respeito a unificação da disputa de poder com a disputa de classes o impasse aparece com força e as dissidências na base do governo se tornam certas.
Falta consenso entre os diversos partidos quanto ao que deve ser aprovado. E pior, falta uma relação mais profunda entre o que se quer aprovar e o que o país necessita. Isto por que os partidos políticos se transformaram em máquinas profissionalizadas de fazer política e conquistar cargos no poder que no mais das vezes não representa mais a vontade das massas, do coletivo da nação. Há hoje uma crise de representatividade no Brasil. A questão, por exemplo, da lista fechada, do voto distrital misto, ou do distritão pode ser extremamente danoso para a nossa democracia se não houver juntado uma educação para a participação política e um controle da influência financeira sobre os resultados das eleições.
A forma profissionalizada como está a política na atualidade, faz com que a maioria das propostas apresentadas no congresso não dê condições a real participação das forças populares no destino do país. É preciso realizar junto com este movimento, um esforço de educação para a política para combater o que Pedro Demo chama de pobreza política. Temos uma política de combate a pobreza, mas ainda não temos uma política de combater a pobreza política que é um dos maiores males do nosso país. E pior ainda, não temos no parlamento atual representantes destas pessoas que necessitam da educação política.
Outra questão que se coloca é a dificuldade de entender a configuração social da riqueza no país. O surgimento da nova classe média da era Lula, e o moralismo abstrato que se estabeleceu nos últimos anos fez com que criasse duas grandes ilusões: a primeira, a de que não existe mais ideologia, e, a segunda, a de que pobres e ricos encontraram uma forma de conviver em uma harmonia divina. O que na verdade está acontecendo é uma ficção de que o problema da pobreza está sendo resolvido quando na verdade, ainda temos estados com 25% de miseráveis, e esta ficção ocorre por que seja no parlamento ou na mídia não tem havido espaço para a denúncias das mazelas sociais.
A reforma política para acontecer precisa aproximar do povo, da massa, ouvir o que o povo pensa de forma destemida, junto ao poder local e sendo tal assunto tratado de forma neutra em relação aos serviços prestados pelo poder local, ou seja, é preciso que o homem simples do povo se manifeste. Em todas as proposições até agora ainda não existe o que pensa o homem simples que faz o desenvolvimento deste país.
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