Educação: Marconi não quer ou não consegue recuar? – A crônica de uma morte anunciada.


Nelson Soares dos Santos

Este texto tenta problematizar como a propalada revolução na educação tornou-se um dos maiores problemas políticos para o governador Marconi, em um momento que ele luta para se projetar nacionalmente.

1.    A complexidade do campo educacional.

A luta em defesa de uma educação pública de qualidade sempre foi uma luta árdua e poucos políticos na história do Brasil conseguiram travá-la com sucesso. Os mais recentes e até hoje não compreendidos saíram do PDT ( Partido Democrático Trabalhista), Leonel Brizola e Darcy Ribeiro. Este último, emérito professor e pesquisador que embora pouco compreendido e pouco lido mesmo na academia deixou ao país um legado inestimável no campo da Educação. O último, Cristovam Buarque, ex-reitor da Universidade de Brasília, Ex-Governador de Brasília, ex-ministro da Educação no primeiro Governo Lula ( demitido por telefone, que aliás, creio ter sido o maior erro político do Governo Lula. Em Goiás, não conheço nenhuma história de nenhum político que mereça ser lembrado por uma defesa da educação de forma decente. Existe sim, alguns que espertamente usaram a educação para se eleger,mas que não foram mais longe que dois mandatos de deputado federal.
2.    Educação e política eleitoral.

Na última campanha Marconi, talvez animado com o sucesso de ter criado a UEG, ( Universidade Estadual de Goiás), ou por tino político mesmo resolveu eleger a educação como prioridade. Até ai tudo bem. Entretanto, içou a condição de líder da revolução educacional proposta uma deputado federal ( Thiago Peixoto), eleito pela oposição que aceitou aderir com o fino discurso que a nobreza da missão valia o risco da adesão política e a traição aos velhos companheiros. O fato, foi tido pela maioria absoluta dos  aliados do Governador como sendo grande jogada política pois, segundo o tal argumento, estava cooptado o mais promissor quadro da oposição e para uma causa nobre. De resto, a manobra política colocava uma deputada do PT ( Partido dos Trabalhadores e da presidente, que só tem 154 deputados de esquerda apoiando seu governo) na base abrindo as portas do Governo Federal para facilitar a resolução de diversos problemas de Goiás. Na época, por pouco deixei-me seduzir por tal argumento,mas lembrei da história de Garrincha – combinou isso com quem? Na verdade, olhando bem tudo estava combinado, menos com quem interessava no assunto – a Sociedade civil goiana.
O que me levou a resistir a sedução de que era uma grande e sábia jogada do Governador foi a prática. Com 19 anos de exercício como professor aprendi que na Educação uma coisa é respeitada – a titulação. O mérito só é visto pelos cursos realizados e de preferência no curso normal da escolarização. Então, fiz o que todo acadêmico faz quando quer saber se alguém merece respeito – fui na plataforma Lattes do CNPQ, e colei o nome do Thiago Melo Peixoto da Silveira. Não encontrei nada entre os doutores, marquei a caixa (demais pesquisadores), também deu busca não encontrada. Ou seja, o homem que pretendia fazer a revolução na Educação em Goiás não possuía currículo Lattes. Com generosidade, procurei o livro que ele havia escrito e publicado sobre assunto – não tinha qualidade de pesquisa acadêmica, antes, parece mais os artigos de opinião que publico neste blog. Foi então que me convenci: a jogada do Governador iria terminar tudo errado. Por um motivo simples – os programas de formação de professores do estado não aceitariam  jamais um economista/administrado com visão neoliberal imprimir mudanças na área onde no estado já existe mais de 400 entre mestres e doutores.

3.    Pacto com quem mesmo?

Intelectuais e acadêmicos são pessoas pacientes. Não atacariam, não falariam, e , esperariam silenciosamente o Secretário revolucionário cometer todos os erros que quem estuda o mínimo de educação já sabiam que ele haveria de cometer. De outro lado, nos discursos silenciosos, artigos, e simpósios iniciaria um movimento consistente dentro da sociedade civil preparando para enfrentar os erros do secretário. E assim foi o ano de 2011. Como se não bastasse, a base aliada aumentou a munição dos erros ao dar um cheque em branco para o governador, que de sua parte repassou-o ao secretário, e que por sua vez perambulou pelo estado falando do que não sabia para pessoas que dedicaram suas vidas a tentar entender esta ciência/arte que se chama educar. Os relatos que se tem é que por onde passou o secretário falou sozinho, e de tão estupefata com as loucuras que ele falava a plateia ficava em silêncio. Conta-se que foi assim no Conselho Estadual de Educação, nas escolas, e em outras Instituições da Sociedade Civil. Ouvia-se, calava e pouco se questionava.
Parece-me que de tão absurda ninguém acreditava que a proposta iria adiante. Foi o que demonstrou alguns interlocutores que ouvi. A proposta de tão absurda é inconstitucional ao retirar poderes do Conselho Estadual de Educação, entre outras coisitas mais. Acreditava-se que ao chegar na Assembleia a proposta seria melhor discutida. Não foi, os deputados não leram. Dizem alguns deputados que confiaram no secretário, outros, que por serem da base aliada deram um voto de confiança a um projeto enviado pelo executivo; outros, admitem ter havido barganha para levar o processo adiante. O certo é que o projeto foi aprovado, e, tudo certo, tudo combinado entraria no ar no mês de janeiro. Foi então que o professorado resolveu fazer contas, e pelas contas feitas alguns teriam seus salários reduzidos em até 600 reais.
Todos sabemos o elementar é que no mundo capitalista nada provoca mais revolta do que você retirar de alguém uma receita que ele acredita já estar garantida, e no caso de alguns educadores, eles pensavam que tal, já estava garantida para o resto de suas vidas. Tudo junto e misturado ( titulação, mérito, ideb na porta da escola,etc) transformou-se em união de fogo e pólvora. Só poderia dar no que está dando. O sintego, que certamente vive e sobrevive de fazer greves, tinha nas mãos a única coisa que realmente mobiliza os professores – perdas salariais. De outro lado, os intelectuais viram que era o momento de dizer o que não haviam dito – eram contra tudo que estava no pacto, e daí, resta a pergunta : Se Deus e todo mundo está contra com quem mesmo foi feito o pacto?
A greve tornou-se um sucesso. Não por que a sociedade gosta de ver professor em greve, mas por que como disse um jornal é “uma greve mais greve que as outras”; na verdade ela representa toda antipatia ao tal pacto, inclusive ao fato de ter se desrespeitado todos os programas de pesquisa e pós-graduação do estado, e, ainda proceder um contrato milionário de consultoria com empresas de outro lugar, que na verdade, e com certeza, muito do que aprendeu sobre educação passou pela leitura de autores goianos, pois hoje, ninguém estuda Educação Brasileira ignorando, ou sem citar, alguns pesquisadores goianos. A greve não é dos professores, é de toda a sociedade. Não é por acaso que neste momento a maioria dos colegiados de cursos da Universidade Federal de Goiás já se manifestara pelo repúdio ao pacto e não diretamente apoio a greve. A greve representa uma indignação contra ingerência política, ou das manobras políticas no campo da educação, é pois, apenas  a ponta do iceberg.
No primeiro momento em que a sociedade reagiu ao tal pacto, o governador foi a campo defender seu Secretário. Entretanto, ao ter em mãos as primeiras análises sobre a situação ensaiou um recuo que não se concretizou. A pergunta que o governador deve estar-se fazendo é: como não fragilizar um secretário que inventou falar de mérito sem ter sequer mestrado ou doutorado? Como falar de mérito uma pessoa que só conseguiu fazer uma graduação e uma especialização? Como tal defensor da meritocracia sequer tem currículo Lattes no CNPQ, em uma área na qual a condição para fazer concurso é ter o currículo Lattes? Como alguém pode pensar que diminuindo o salário de outro alguém, este outro alguém vai ficar feliz?
De outro lado, os deputados e partidos aliados todos silenciaram. E o pior, os problemas no governo não param de aumentar. E a rejeição ao tal pacto também aumenta. O interessante e que ninguém tem notado é o estratégico silêncio dos lideres a oposição. Os poucos deputados que se dizem de oposição votaram contra e depois simplesmente silenciaram. A greve se transformou em uma greve da sociedade. De outro lado, esta sociedade que é um caldeirão de movimento estrutural e super-estrutural agita-se de forma estrondosa invadindo outras áreas como segurança, Saúde, Justiça e minando a popularidade do Governador. É claro que sabemos da grande sabedoria e perspicácia do governador, mas, desta vez a resistência vem da sociedade, dos núcleos familiares e não mais de um adversário político que representava o atraso.

4.    Poder – a arte da Guerra.

Já escrevi aqui certa vez sobre a “Arte da Guerra” ( estou com preguiça de procurar o artigo e colocar o link, quem quiser, busca na barra de pesquisa do blog). E, uma das coisas que escrevi é que em determinados momentos torna difícil saber quem tem o tao da guerra. Uma das coisas que questionei foi : Tem Marconi o poder de decidir sozinho determinadas questões como teve no primeiro e segundo mandato? A resposta sempre me pareceu ser não. Simples, ganho no segundo turno,com pequena diferença de votos (53%), e precisou do apoio de quem com ele já tinha profundamente divergido e pensa divergente ( Demóstenes Torres e Ronaldo Caiado). Logo, sempre compreendi que neste mandato, o governador navega em mares perigosos, que como diria Confúcio é difícil saber quem de fato tem o poder de decidir.
Quando escrevi sobre as razões que me levavam a descrer que Thiago Peixoto não faria a propalada revolução ( O professor de voz rouca e a revolução de Thiago Peixoto), disse que ele não tinha os elementos ao seu favor. Aliás, vendo agora que ele sequer tem currículo Lattes, vejo que ele só tinha mesmo a ilusão ao seu favor. Junte-se a isso que o deputado secretário não era um quadro experimentado que inspirava confiança, antes, era apenas uma promessa. As fragilidades do governador  não ter o controle das forças do seu governo, aliada as fragilidades do projeto e do secretário ( leia-se não é o projeto do secretário, é fragilidade do projeto do pacto e do secretário),facilitaram o aumento dos ânimos para que a sociedade reagisse. Quem fez outra leitura pode ter pensado que pessoas chaves em lugares chaves,daria  o controle da sociedade. Mas, esqueceram que pessoas não controlam as massas, e sim, as massas controlam as pessoas. Dito isso, explica-se o silêncio dos líderes da base sobre o tal pacto, ( Ronaldo Caiado, Demóstenes Torres, Roberto Balestra, Jovair Arantes). Todos esperam o momento certo para estar com as massas, afinal, como em roma, o segredo ainda é ganhar o povo.
No campo da estratégia vê-se poucas saídas a não ser recuar com humildade antes que o movimento fortaleça mais, e contagie outras áreas do governo. Mesmos com todas as estruturas de manipulação ideológica dominadas ( diga-se a imprensa falada e escrita que depende das verbas do governo, pois a internet ninguém controla) , o governo não sabe o que fazer. Como defender um projeto educacional que conseguiu unir contra si a grande maiorias dos especialistas, mestres e doutores da área e congêneres? Como recuar sem destruir a carreira do “Promissor” secretário? Estaria um dos mais sagazes governador de Goiás sem saída?
Claro que agora bem que o Thiago poderia demonstrar aquele desapego humanitário que o levou a deixar o PMDB e aderir, para pedir demissão do cargo como reconhecimento do imbróglio no qual colocou o governo, o governador, e, claro, em respeito a educação que ele tanto preza e admira. Afinal, o que ele escreveu e publicou, duvido que os pesquisadores da área não deem risadas quando leem, para nada serve a não ser o fato de contribuir para a destruição da natureza. Duvido que algum pesquisador neoliberal veja alguma profundidade em tais artigos, e,se Roberto Campos levantasse do túmulo e lesse, morreria de vergonha de ver no que se transformou as teorias do capitalismos de resultados.
A empresa essencial do estado é a arte da guerra, dizia Sun Tzu. Neste caso a guerra está declarada. De um lado um quantidade imensa da sociedade civil ( 1096 escolas, 600 mil alunos, e, declaradamente repudiando, inúmeros pensadores do estado). De outro, a mais nova proposta de revolução educacional.  Na guerra, no entanto, há coisas que não pode esquecer. Como dizia o mineiro, vai que amanha o céu amanhece de outro jeito? E Sun Tzu dizia: Alguns generais tem, de alguma forma, o tão do céu, da terra ao seu favor, e acontecimentos inesperados podem mudar totalmente o jogo. A fragilidade da oposição, a crise na base de Paulo Garcia, e outros elementos podem fazer surgir soluções inesperadas, soluções que ainda pode ser apenas mistérios para quem não tem o saber do tao. Afinal, o General é o pilar de sustentação do Estado, e, neste caso, mesmo não tendo o controle de todas as forças – Marconi Perillo ainda é o General no comando. Então, a pergunta continua:dado a correlação de forças e a crônica anunciada – Marconi não quer ou ainda não conseguiu recuar???

Comentários

  1. Acho que o governador foi muito afoito nomeando
    alguém fora do meio educacional para secretário.
    Quanto à revolução na educação é apenas uma pla-
    taforma política, não passa disso.Chegamos à triste conclusão: os governantes brasileiros não
    dão a necessária importância à educação.

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