Posições e posturas sobre o Pacto da Educação em Goiás
Nelson Soares dos Santos
Não se poderá dizer no futuro que o chamado Pacto pela Educação, do
deputado, economista e especialista em Gerenciamento de projetos pela
Universidade da Califórnia Thiago Peixoto não tenha tido nenhuma utilidade.
Afinal, a última vez que a Universidade, o Conselho Estadual de Educação e o
Sintego assumiram posição do um mesmo lado (no caso atual, contra o pacto) foi,
que eu me lembre, entre 1986/1987, nos processos e lutas que antecederam a
elaboração da atual LDB. Naquele tempo houve uma mobilização geral envolvendo
escolas, conselho, universidade e entidades da sociedade civil na busca de
consensos para se pensar a educação brasileira.
Só por este mérito se pode pensar a proposta atual da Secretaria de
Educação. Acordou do sono dogmático professores que há muito desistiram de
pensar a educação, fez sair do isolamentos acadêmicos que já não tinham nenhum
fé em discutir políticas educacionais, e, deu vida a um sindicato que há muito
tempo não tinha sucesso algum no processo de mobilização da categoria. Fora isso,
no denominado “Pacto pela Educação”, em nada mais pode ajudar, e talvez seja
chegada a hora dele sair de cena para que a verdadeira revolução na Educação
possa começar em Goiás e se espalhar pelo resto do Brasil. Pensando nisso, é
que podemos elencar teorias, posturas e posições atuais e fazer exercícios de
elucubração de caminhos futuros.
1. Porque o Pacto da Educação
não é um Pacto.
A origem da palavra pacto vem do judaísmo. Se considerarmos tal origem,
poderíamos até dizer que existe um Pacto pela Educação em Goiás. Em sua origem,
e segundo os estudiosos do judaísmo, a palavra teve sua origem no pacto que
Deus fez com Abraão, no qual, inclusive, mudou o nome dele de Abrão para
Abraão. A palavra seria uma derivação de Berith — que significa cortar. Teria
relação com o fato de Abraão ter cortado os animais para fazer o sacrifício ao
Divino, e, depois disso, Deus, apenas Deus, passou por sobre os sacrifícios.
Deus ter passado sobre os animais cortados e sacrificados significa, para os
estudiosos do assunto, que apenas Abraão fez um pacto com Deus, e que Deus não
fez nenhum pacto com Abraão, pois, sendo Aquele onipotente, não poderia
contratar ou fazer acordo com os seres humanos, mas apenas estabelecer as
condições pelas quais o homem poderia ter as benesses divinas, e o vínculo
estabelecido seria de total submissão ao chamado Deus todo-poderoso.
Parece crível que esta foi a possibilidade do “pacto” estabelecido por
Thiago Peixoto. Ele propôs, estabeleceu-se como um todo-poderoso e o vínculo
estabelecido seria por total submissão ao desconhecido, uma vez que as medidas
de mudanças foram e estão sendo estabelecidas de forma paulatina e misteriosa.
Primeiro, o aumento do número de alunos em sala de aula (que parece não ter
nada a ver com a educação pública, mas futuramente veremos que tem), depois, as
mudanças curriculares, em seguida, a mudança que fez a casa ser abalada — o
plano de carreira e a titularidade. O que acontece agora é que os demais atores
que deveriam se submeter às mudanças propostas (sindicato, universidades,
escolas, e professores) perceberam que só as mudanças anunciadas são
prejudiciais a muitos interesses pré-estabelecidos, e que, na verdade, não há
esperança de melhora no quadro, e sim de que as coisas se tornem ainda pior do
que já estavam.
Felizmente, a palavra pacto em português e em espanhol não tem o
significado de vínculo imposto por um poder misterioso. Pelo contrário, sua
origem etimológica, ou a forma como passou ser usada, significa acordo,
contrato, convenção, ajuste, negócio que se realiza entre duas pessoas. Neste
sentido, para ser pacto era preciso que as demais partes interessadas (pais de
alunos, professores, servidores, universidades, sindicato, Conselho Estadual de
Educação, Conselho Estadual de Direitos Humanos) tivessem sido consultadas, e
que tivessem aceito o acordo, convenção, ajuste, estabelecido e ou proposto
pela Secretaria de Educação, e, melhor, que o tal pacto fosse corroborado por
todas as partes envolvidas.
Neste sentido, o pacto nunca foi um pacto. Imposto pela secretaria, não
baseado na realidade goiana, com consultoria externa, em nada houve
participação dos atores envolvidos na prática educativa local. Mesmo entre os
partidos políticos aliados, que, em tese, deveriam sair em defesa junto a
sociedade, não houve sequer divulgação suficiente das ideias para que formassem
uma opinião sobre o mesmo. Pelo menos é que parece, de um lado pela ignorância
admitida pela maioria dos deputados, e, por outro, pelos pedidos públicos de
desculpas já externados na mídia. Se houve pacto, este foi feito com forças
cujo objetivo seria massacrar qualquer resistência a implantação das mudanças
desejadas.
2. Posições e Posturas em
relação ao Pacto da Educação.
Não temos como falar de posições e posturas em relação ao pacto sem
antes observar a forma como se chegou à Secretaria da Educação o titular da tão
propalada revolução. Como todos já sabem, e já foi tratado neste blog, não vou
entrar no mérito, apenas lembrar que foi uma jogada política, considerada por
muitos como de mestre que tirou dos adversários o principal e mais promissor
quadro político. A questão é que, feito isso, uma série de consequências se
desencadeou no silêncio dos bastidores do poder, e aqui cito pelo menos algumas
delas: a) Primeiro, passou-se a ideia de que não existia na base do governador
pessoas preparadas o suficiente para pensar a política educacional, e, por mais
que ninguém dissesse, ficou no ar uma situação desconfortável, sobretudo entre
especialistas, mestres e doutores em educação; b) segundo, para agravar, o novo
secretário, além de não ser da área (economista pela PUC de SP, e especialista
em Gerenciamento de Projetos pela Universidade da Califórnia), contratou uma
consultoria externa, o que reforçou a ideia de que não havia em Goiás pessoas
suficientemente preparadas; c) terceiro, a forma como se deu a engenharia
política fez com que todos os membros de partidos aliados se sentissem
constrangidos e começassem a desejar o quanto antes que o neo-aliado queimasse
na fogueira da vaidades (é o que se chama de fogo-amigo).
Durante o primeiro ano do processo de mudanças não houve tomadas de
posição que pudesse ser consideradas relevantes. Todos ficaram em silêncio. E
foi isso que animou o revolucionário a prosseguir. Quanto a posturas, estas,
sim, podemos elencar algumas.
A postura mais interessante e pouco analisada tem sido as dos principais
líderes dos partidos aliados. Começou a correr nos bastidores da política que,
na verdade, não aconteceria revolução nenhuma e que, uma vez o novíssimo adesista
fosse queimado, tudo voltaria a ser como antes. Isso, é claro, não ficou apenas
nos bastidores íntimos, era possível ser ouvido de prefeitos nos principais
rincões do Estado, e que por sua vez caía nos ouvidos dos vereadores (muitos
deles aliciados de outros partidos para constituir o novo partido lotado de
adesistas), e que por suas vez levava a notícia aos professores e trabalhadores
em educação, minando um ano antes a possível autoridade que o secretário teria
para imprimir mudanças boas, agora imagine mudanças ruins.
Outra postura interessante foi a do Sintego. Tendo um aliado que
tornou-se deputada devido a engenharia política ocorrida, não só perdeu ainda
mais forças para mobilizar a categoria, como no primeiro ano não demonstrou
tanto interesse em investir na discussão do pacto e das novas políticas. Já a
imprensa é uma postura que caberia um artigo a parte, mas que pode ser resumida
em algumas palavras — tornou-se correia de transmissão da Secretaria de
Educação, sobretudo os dois principais jornais do Estado. Houve casos em que
resumos de notícias enviados pela secretaria eram e são publicados como
exatamente escritos. Uma imprensa assim não pode ajudar muito a sociedade, é
como, se fossem, na verdade, todos assessores de comunicação do governo.
As universidades, talvez confiante de que são delas que saem e ou nelas
se formam todos os professores, ficaram em uma postura de “vamos esperar para
ver até onde isso vai”. O Conselho Estadual de Educação também ficou meio na
espera, até por que os seus membros são na sua maioria egressos da própria
universidade e ou ainda estão nela exercendo prática pedagógica ou de pesquisa.
3. O mérito do Inesperado.
Posso estar errado, mas não me lembro de ver o Sintego anunciar ou
ameaçar fazer greve geral quando da aprovação do pacto. No entanto, o
inesperado aconteceu. Um grupo de professores (e já que a palavra da moda é
mérito, o mérito é deles), chamado Mobilização dos Professores de Goiás, que já
tentava se organizar de forma independente desde a greve dos professores da
rede municipal de ensino, cujo prefeito é do PT/Sintego, ganhou força e foi
para as ruas. Este, penso, foi o grande diferencial de toda a situação.
Pego no contrapé e correndo o risco de perder totalmente o controle da
categoria, e vendo o grupo ganhando cada vez mais forças, o Sintego foi lançado
na obrigação de organizar a greve dos professores. Uma vez na linha de frente,
o Sindicato, com sua poderosa estrutura, tornou a frágil mobilização dos
professores em um instrumento poderoso, porém a greve hoje não está mais no
controle de nenhum, nem outro, uma vez que passou a ganhar a simpatia da
população.
O fortalecimento da greve foi levando, aos poucos, instituições e
pessoas que não tinham tomado posição em relação ao pacto, e que parecia que
não iria tomar, a reagir e assumir as responsabilidades sociais que deles se
esperam. É neste grupo que vejo as reações das faculdades, universidades e
programas de pós-graduação em formação de professores. Daí, quando as pessoas
se deram ao trabalho de ler o tal “Pacto”, veio o pior. Todo mundo pensava que
se tratava de um documento bem fundamentado, embora pudesse ser prejudicial ao
plano de carreira dos professores. O que se viu foi erros bárbaros, como, por
exemplo, a tentativa de retirada de competências do CEE (Conselho Estadual de
Educação), e a tal avaliação de mérito, que coloca em dúvida o papel das
universidades.
Não havia outra saída para as universidades e para o Conselho Estadual
de Educação a não ser, no mínimo, solicitar que o tal Pacto fosse revisto. De
tão absurdo, o pacto não pode ter o apoio de nenhum educador com autoridade ou
com mestrado e ou doutorado na área. O pacto da Educação transformou-se no
pacto do diabo, aquele no qual alguém vende a própria alma na busca insaciável
pelo poder. O que coloca as universidades contra o pacto não são questões
ideológicas, e sim, na verdade, a total falta de rigor científico,
fundamentação, e concatenação de ideias. O pragmatismo político superou-se a si
mesmo e conseguiu um milagre — mobilizar os professores, fazer o Sintego
declarar greve geral, a universidade adormecida se manifestar, e, o melhor de
todos, os políticos graúdos do Estado ficarem em silêncio.
[1] http://old.thirdmill.org/files/portuguese/63346~9_19_01_10-35-35_AM~breve_introducao_ao_estudo_do_pacto.htm
Aqui você encontra um bom estudo sobre a palavra pacto.
adorei a abordagem da palavra pacto .. acho q isso solidifica o discurso
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