Conselhos àqueles que buscam o Conhecimento Verdadeiro.
A revolução ocorrida nos meios de comunicação nos últimos séculos, desde a invenção da impressão de livros em larga escala, e da popularização de todas as formas de comunicação a ele ligado, bem como, o surgimento do telefone, correios, telégrafos, e por último a internet, criou a falsa impressão de que o conhecimento verdadeiro, ou a verdade sobre as coisas está ao alcance de qualquer pessoa. Os instrumentos tecnológicos, produtos do desenvolvimento da ciência, contribuíram, então, para criar uma legião de pessoas com acesso a informação fácil, e neste sentido a pergunta é: significa, pois, que todos tem acesso ao saber? A resposta é não, e vamos dizer as razões.
Nos últimos anos um instrumento tem chamado a minha atenção: o Google. Recentemente, vi uma reportagem na qual se dizia já haver viciados no Google. A explicação é simples. Se no século passado as pessoas consultavam o dicionário ou perguntavam aos mais velhos, hoje, pergunta-se ao Google. A diferença é que no passado você se confrontava, e no máximo, com uma dezena de respostas, hoje, no Google, você se estiver com sorte, vai se confrontar com uma centena de possibilidades. Como então escolher a resposta que mais se aproxima da verdade?
Não resta dúvida de que estamos diante de muita informação. No entanto, como já afirmou Edgar Morim, depois de anos de estudos e pesquisas no campo da Teoria do Conhecimento, “Informação não é conhecimento, e conhecimento não é sabedoria”, e, mais ainda, exclama o filósofo Francês: “Quanto de conhecimento se perde na informação, e quanto de sabedoria se perde no conhecimento”. Vivemos no tempo da muita informação com pouco conhecimento e do pouco conhecimento com ainda menos sabedoria.
A resposta para tal enigma pode ser encontrado ainda na filosofia dos Gregos Antigos. Platão em sua Paidéia, Aristóteles em Sua “Ética a Nícomacos”, de alguma forma já tentava responder a tal questão. Fiquemos com Aristóteles por ora. O sábio de Estagira soube reconhecer que a sabedoria é uma das cincos virtudes intelectuais, e que, tanto virtudes intelectuais quanto as virtudes morais, são na verdade virtudes da alma – uma forma interessante de resolver a dicotomia de Platão em relação ao mundo sensível e o mundo intelígvel – mas que só era possível desenvolver as virtudes da alma, tanto a moral quanto a intelectual pelo exercício, sabendo que a moral se desenvolve pelo hábito, e que a intelectual gera e cresce pelo ensino.
Ora, então, a coragem, a veracidade, a amabilidade, o Justo orgulho, a espirituosidade, o respeito próprio, a gentileza, a magnificência, a liberalidade e a temperança se aprende na vida, com o hábito, por meio de exemplos, pelo bom senso, mas as virtudes intelectuais, estas só pelo ensino, sendo elas: O discernimento, a arte, a inteligência, a prudência e a sabedoria. O grande problema é que na vida real, na vida vivida as coisas se tornam ainda mais complexas, no momento em que no mundo vivido, ou mundo da vida ( para nos servir de Habermas), tudo acontece concomitante. Traduzindo, não é possível o aprendizado do justo meio sem o discernimento, e de nada serve o discernimento sem a inteligência, a inteligência sem a ciência, e, a ciência sem a sabedoria.
No mundo de hoje, é senso comum saber ler, e ser analfabeto é considero imoral por alguns, e, sendo assim, este é o primeiro passo para começar a busca do conhecimento. Uma vez, sabendo ler, encontramo-nos diante da maior armadilha pois começamos a acreditar que já podemos seguir por nós mesmos, sem precisa de tutores. A questão é que nem sempre o aprendizado da leitura vem acompanhado do aprendizado do pensar, ou o que alguns chamam de leitura de mundo. E, por isso, temos muitas pessoas que aprendem a ler, fazem faculdade, e até mesmo os modernos “Doutores da Lei”, que na verdade não passam de analfabetos funcionais por que não são capazes de pensar de forma livre, original e libertadora. São escravos do já feito e passam a vida como papagaios, aliás, consultando o Google.
Voltando ao início do texto, isso acontece, por que informação não é conhecimento. O conhecimento exige disciplina do corpo, exige em algum grau, virtude moral, ou que se saiba e se tome consciência de se viver e lidar com os vícios da alma. A muita informação poderá até fazer doutores, não fará, no entanto, pensadores. E como tudo é feito em série, podemos ter jornalista, escritores, e tantos outros, preocupados com vírgulas, pontos e vírgulas, parágrafos, tipo de letra, técnicas, menos capazes de produzir idéias que de fato produza coisas novas.
O conhecimento exige discernimento, saúde dos sentidos. É necessário desenvolver a imaginação, não a imaginação doentia do mundo da fantasia pornográfica, mas a imaginação criadora. É preciso praticar a leitura como um passeio da alma pela estrada já construída pelos outros, e não a leitura para os sentidos doentes, para a imaginação doente, que busca ávido um pouco de paz na angústia da existência. É necessário desenvolver a sensibilidade, a acuidade, o senso crítico, o rigor – não o rigor formalista, mas o rigor da profundidade, do raciocínio correto que vem do desejo correto e do pensamento correto.
Não é possível, no entanto, desenvolver tais caracteres sem a saúde dos sentidos. A vida desregrada da atualidade, a falta de lucidez, a libertinagem que reina em todos os lugares, a falta de disciplina são as razões do crescimento da ignorância e da escuridão nos dias atuais. O aumento da informação banalizou o saber. Acredita-se que se sabe, quando na verdade, sequer existe o pensamento, e não existe saber sem o pensar.
O conhecimento foi banalizado na internet. Parece que tudo está ao alcance, do senso comum à metafísica. Difícil é saber o que é cada um deles. O senso comum, ou o mundo das opiniões misturou-se com os demais tipos de conhecimento, por isso, quando se pensa que se está lidando com o conhecimento teológico, é apenas com o senso comum do conhecimento teológico que se está lidando, e o mesmo se aplica a ciência, a filosofia, a metafísica, e, ao ocultismo.
Ora, isso acontece por que cada um dos tipos de conhecimento exige daquele que se propõe alcançá-lo uma certa disposição de caráter. Assim, para a filosofia exige que se tenha um pouco de racionalidade, para a ciência, racionalidade, método e demonstrabilidade; para o conhecimento teológico a sobreposição da fé a razão, e no misticismo a capacidade da transcendência. No final, todos partem do senso comum, ou seja, o mundo dos sentidos e das opiniões, mas este é só o ponto de partida, nunca pode ser o ponto de chegada, aliás, é de se perguntar se na busca pelo saber existe um ponto de chegada.
Não conscientes disso, muitos colocam a disposição dos leitores verdadeiras aberrações que chamam de interpretação dos clássicos, seja da ciência, da filosofia, da religião ou do ocultismo. O que na verdade acaba chegando a maioria dos desavisados é apenas o a opinião de alguém sobre algo do qual muitas vezes nunca se pensou seriamente. Posto tais questões, deixo aqui alguns conselhos que poderão ser seguidos àqueles que buscam o conhecimento com seriedade, como busca, e não apenas como instrumento da sobrevivência.
1. Desconfie de tudo que é encontrado com muita facilidade. Quase nada é o que parece. Aliás, este foi o conselho de Descartes há séculos atrás. Faça tudo aquilo que é colocado diante dos seus olhos passar pelo crivo de sua razão, se não for claro, se pelo menos não lhe parecer claro não aceite como verdadeiro.
2. Eduque os sentidos. É pelos sentidos que tudo começa, mas é também por eles que pode tudo terminar. Eles podem ser a maior barreira na construção do saber. Sentidos doentes, viciados, embotam mente e impede o desenvolvimento da Inteligência e do discernimento.
3. Desenvolva o aprendizado do pensar. Reflita sobre tudo que vê, lê, perceber. O maior livro da vida é a natureza, a vida vivida. Todos os livros da humanidade foram escritos apenas com o objetivo, de em ultima instância, compreender as relações homem-natureza.
4. Mantenha a mente aberta, abra mão dos preconceitos, primeiras impressões, primeiras opiniões sobre o que quer seja. As primeiras impressões são, quase sempre, falsas, quando no máximo, são incompletas, e constituem-se em obstáculos ao desenvolvimento do discernimento.
5. Busque sempre a mediania. A quietude é o segredo do caminho do saber. Quietude do corpo, quietude dos pensamentos. Aprenda a contemplar as belezas mais simples, desenvolver a compaixão, participar do universo.
6. Não tenha medo do conhecimento e da sabedoria. O conhecimento não lhe tornará nem bom, nem mal, nem crente, nem ateu. No final, se fores livres você se tornará o que você escolher se tornar. No final, serão suas escolhas que farão a diferença.
7. Convença-se de sua humanidade. É pelos nossos corações que tudo começa, e é nele que tudo termina. Somos, enquanto habitarmos esta terra, simplesmente humanos, dignos das coisas mais belas e, das coisas mais terríveis.
A primeira escolha a fazer é pois, se queremos continuar vivendo no mundo das opiniões, - este mundo onde todos parecem serem sábios sem na verdade ser – ou se queremos admitir a complexidade do viver, e por extensão a nossa ignorância. Somos colocados diante do fato de que não sabemos, não nos é possível ter opinião verdadeira sobre todos os fatos que nos são colocados o tempo todo, diante de nós. Que escolhamos então,e, não se esqueçam, tudo que está aqui pode não ser conhecimento, pode ser apenas uma opinião.
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