A democracia prostituída
Uma das obras mais completas que já li sobre a ditadura militar no
Brasil, que começou em 1964, e teve seu fim oficial com a posse de José Sarney
como presidente da República, foi a Obra de Eiio Gaspari. Ele escreveu diversos
volumes, sempre adjetivando cada momento da ditadura. O primeiro volume da
série que tem como titulo “As ilusões Armadas”, é “A ditadura envergonhada”.
Hoje, 31 de março, data do que é considerado, oficialmente o inicio desse período
, talvez seja um bom momento para relembrar alguns fatos. A tentação autoritária, no Brasil, não
começou no ano de 1964, tão pouco nos anos que o antecederam. Desde o inicio de
nossa história, ainda no Brasil Império vivemos uma série de tentativas de autoritarismos, que em processos cíclicos fizeram
parte de nossa história.
A ditadura que começou “envergonhada”, não demorou muito tempo para se transformar em uma ditadura escancarada, e se entrou em decadência nos anos seguintes, o seu fim, com a chamada anistia geral e irrestrita deixou rastros e sementes que germinaria no novo momento democrático. E estas sementes, contribuíram para contaminar e prostituir a democracia que nasceu no país.
A ditadura que começou “envergonhada”, não demorou muito tempo para se transformar em uma ditadura escancarada, e se entrou em decadência nos anos seguintes, o seu fim, com a chamada anistia geral e irrestrita deixou rastros e sementes que germinaria no novo momento democrático. E estas sementes, contribuíram para contaminar e prostituir a democracia que nasceu no país.
Primeiro, por que ao conceder anistia geral e irrestrita, foi deixado
para trás a oportunidade de acerto de contas com aqueles que extrapolaram o
respeito pela vida, seja do lado da Ditadura, seja do lado dos que lutaram pelo
retorno a democracia. É preciso um olhar
distanciado para admitir que de ambos os lados, houveram excessos. Se a luta
pela ordem não pode admitir a tortura ( ao menos os militares argumentavam que
defendiam a ordem); a luta pela liberdade, democracia e igualdade de
oportunidades também não deve e não pode comportar o desrespeito pela vida
humana. Em segundo, lugar, ao anistiar os transgressores da ética Universal de
ambos os lados, a democracia que nascia, permitiu a sobrevivência de homens e
mulheres, que por não terem sido punidos, continuaram, mesmo que de forma
sutil, práticas que não se coadunavam com o espirito democrático.
Estas sementes cresceram no seio da democracia. Sobre o pretexto do
respeito às opiniões divergentes foi sendo tolerado diversos exageros que
fizeram crescer lideres, e dar vozes a comportamentos racistas, misóginos,
xenófobos, etc, que na essência desrespeitavam os mais elementares fundamentos
dos direitos humanos. Com o tempo, tais discursos ganharam vida e rostos, o
mais famoso é hoje o atual presidente da República Jair Messias Bolsonaro. Expulso do exército por atentar contra a
ordem, ironicamente, hoje governa cercado de militares da ativa e da reserva, e
faz jus aos discursos proferidos, governa o tempo todo sob a tentação do
autoritarismo, da xenofobia e do desrespeito a vida humana. Não é porém, o maior problema da democracia.
Tais rostos e discursos estão em todas as esferas.
Nos municípios, há vereadores que possuem mandatos desde o ano de 1989,
quando oficialmente chegou ao fim a ditadura. Esconderam seus discursos,
negaram seus próprios atos e sobreviveram repassando a herança autoritária ás
novas gerações, e mais que isso, mantendo uma certa base de influência entre o
povo por meio de um assistencialismo, sobretudo nos lugares ou questões as
quais o estado não consegue alcançar. Por outro, lado, mantiveram ou se
encastelaram na estrutura do estado, uma vez, que vindos de estar dentro do
sistema, estavam melhor preparados para competitividade, seja por meio de
concurso para o serviço público seja como prestadores de serviços para o estado
com suas empresas privadas.
Os Governos FHC, Lula e Dilma, sobretudo no governo Lula, quando uma
ampla aliança foi feita com estes grupos conservadores, todo este grupo se
fortaleceu da base ao topo. Embora, tolerassem a liderança de Lula,
fortaleciam-se economicamente e guardavam o discurso conservador para o
enfrentamento. Durante todo este tempo, mais de vinte anos, a nossa democracia
foi prostituída. A pretensa aliança que pretendia dividir ao menos parte do
bolo, guardava como consequência o ressurgimento, agora em forma de fanatismo
irracional, o ressurgimento de um discurso conservador/liberal ultrapassado que
culminou na eleição de Jair Bolsonaro para presidente da República. E eis, que muitos democratas se perguntam
onde erraram. Não é difícil descobrir. O erro foi permitir que a democracia
jovem se tornasse uma prostituta a dormir com seu antigo algoz.
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