A História de um processo parte 3. - Sobre sonhos e ideais interrompidos.

  

Sonhos possíveis.

Eu tive a vida toda, ao menos dois sonhos que mantiveram acesas minhas esperanças de viver: 1. Construir uma família, 2. Ser um  homem público, como professor, pesquisador, político que fizesse a diferença na  sociedade. Ao retornar para Goiatuba naquele domingo a tarde eram estes pensamentos que permeavam minha mente. Eu não poderia desistir. Ao comentar na viagem com o Professor José Hidasi sobre estes sonhos, ele me alertou, do alto dos seus vinte anos a mais de vida que possuía, de que eu deveria tomar muito cuidado com o que sonhava. Segundo ele, eu estava vivendo um momento já ímpar na vida. O mestrado me dava uma posição social que estava e me colocava acimada da média do que a sociedade aceitava para uma pessoa que vinha de baixo como eu.

Segundo ele, pessoas idealistas e que se preocupavam com o bem comum não eram as mais queridas da sociedade. Citou exemplos como Mandela que foi preso e tantos outros. Afirmou taxativamente, que a chegar em Goiatuba eu deveria esquecer minha competência técnica, meu compromisso político com a educação e deveria buscar entender os reais motivos pelos quais eu estava sendo afastado. Ele foi a primeira pessoa a dizer que via na situação uma perseguição inusitada e sem motivos. Quando cheguei a Goiatuba comentei e questionei o Professor Ivaldo e ao Professor Anderson, quanto esta linha de raciocínio, no que fui dissuadido de ver naquela situação uma possibilidade de racismo, xenofobia ou perseguição gratuita. O máximo que opinaram era que sim, que Goiatuba consistia em uma cidade conservadora e as pessoas ali não viam de forma tranquila que um negro saído de não sei onde começasse a dizer o que era certo e errado para o bem  comum.


Tais conversas não foram suficientes para que eu entendesse o que estava acontecendo. Naquela época eu tinha descoberto as leituras orientais do confucionismo, budismo, hinduísmo, xintoísmo, etc. Estava fazendo um curso de Reiki para o qual tinha sido convidado por uma mestra em Goiânia. Gostava e sentia prazer na meditação e procurava meditar todas as manhãs. O contato com as religiões orientais e o aprendizado da meditação me levaria do Reiki, no qual me tornei Mestre, ao estudo do esoterismo e do misticismo, em um tempo no qual minha religiosidade se restringia ao cristianismo com práticas católicas e kardecistas. Talvez, tenha sido a espiritualidade que não permitiu que eu visse tanta maldade nos seres humanos que me rodeavam. Eu estava ainda preenchido pelo desejo de salvar as pessoas, e a acreditava quase que numa bondade inata que as leituras de Satre, Niestche, e toda filosofia ocidental não tinha sido capaz de me fazer reconsiderar.

De outro lado, as leituras de Davi Ricardo, Loke, Kant, Hegel, que me alertavam para o individualismo, o egoísmo humano e  a dualidade  parecia algo a ser combatido. Talvez ainda a forte influência sofrida pelo contato com as obras marxistas entre os anos de 1996 a 2004, e um sonho nato de construir um paraíso na terra, impedia que eu visse uma lição muito simples na cidade de Goiatuba – Havia ali uma ignorância profunda, uma carência cultural e de conhecimento na classe dirigente que era quase intransponível e o que os regia era o egoísmo,, o interesse próprio, a ganância pelo poder e pelos prazeres da carne.

Naquela época presidia a FESG, Fundação de Ensino Superior de Goiatuba, a Jovem Dr. Talita Hayasaki. Foi uma longa conversa. A jovem presidente, de forma descontraída inquiriu-me sobre os mais diversos assuntos. Apenas anos depois percebi que aquela não tinha sido uma conversa amigável e sim uma quase audiência judicial.  Senti-me respeitado e respondi todas as questões de coração aberto. Eu, também,, não tinha nada a esconder. Depois de mais ou menos uma duas horas ou mais de conversa, a Doutora abriu o processo sobre a mesa e disse: Isso é o que o professor Alzair me enviou de você. Tecnicamente eu deveria tomar alguma providência. Eu não posso forçar o Professor Alzair a receber você de volta no corpo acadêmico da faculdade, mas também não vou lhe demitir. A saída pra você é tentar conversar com eles mais uma vez, e se não der entre na justiça e busque seus direitos. Eu, de minha parte, não farei nada nesse processo, por que não vou colocar minha carreira profissional numa situação que está claro que existe algo que não consigo ver. Não vejo o senhor incapaz de assumir a sala de aula, e aqui não tem os requisitos legais para que o Senhor seja demitido.

Dezoito anos depois, procurei a doutora para conversar sobre o processo. Ela repetiu as mesmas coisas. Que já fazia muito tempo, mas se lembrava  bem que quando pego o processo e começou a ler, pensou que ali tinha “angu de caroço”, e que não havia nada que pudesse comprometer a minha carreira como docente naquele processo.

Eu confesso, revendo as memórias, que fiquei decepcionado com aquele encontro pois sai daquela sala, naquele fatídico ano de 2004 com a sensação de que minha vida estava tomando um rumo que eu não compreendia. Segui os conselhos e busquei dialogar com o Diretor, professor Alzair Eduardo Pontes, mas todo esforço foi inútil e infrutífero. Retornei a Goiânia com o processo na pasta e muita tristeza para começar uma luta que até o presente momento não acabou.

Naquele dia, meu idealismo e meus sonhos foram o aporte que mostrou a Doutora Talita minha personalidade. Eu tinha sonhos, sonhos de um mundo melhor. E trabalhava, vivia, falava, estudava, sempre com o mesmo objetivo de tornar o mundo um lugar melhor para se viver. Eu era sincero em minhas ações, em meus pensamentos e em minhas palavras.

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